Por Renné Fuganti
Advogado
Especialista em Direito Empresarial
A
responsabilidade civil e criminal do Vereador é balizada e prevista no art.
29 cc com o art. 58 da Carta Magna
brasileira vigente.
A
legislação prevê que no art. 29,inc VIII, a inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no
exercício do mandato e na circunscrição do Município.
Mas
até que ponto a imunidade deixa de ser aplicada e o Vereador inicia a responsabilidade
civil por seus atos?
Vejamos
primeiro a redação dada aos artigos constitucionais.
Art.
29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o
interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara
Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta
Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
VIII
- inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no
exercício do mandato e na circunscrição do Município;
(...)
Art. 53. Os Deputados
e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas
opiniões, palavras e votos.
Com
base no Julgamento do Recurso Extraordinário n 210.917-RJ Sendo o relator
Ministro Sepúlveda Pertence, em 12/08/98, em plenário afirmou o seguinte
entendimento a cerca do tema:
“A
inviolabilidade parlamentar elide não apenas a criminalidade ou a
imputabilidade criminal do parlamentar, mas também a sua responsabilidade civil
por danos oriundos da manifestação coberta pela imunidade ou pela divulgação
dela: è conclusão assente, na doutrina nacional e estrangeira, por quantos se
têm ocupado especificamente do tema.”[1]
A
grande questão a cerca deste tema é saber a linha tênue que divide a imunidade
da responsabilidade. A Constituição
Federal prevê em seu art. 29, VIII, c/c o art.
53, “caput”, a imunidade, mas tudo no direito pende de interpretação e o juiz
pode interpretar a favor ou contra a pessoa.
O art. 29, inc VIII, prevê uma limitação territorial, ou
seja, na circunscrição do Município, entendendo o Município atuante do Vereador,
mas então se o Vereador está fora de seu Município em serviço a casa
Legislativo não está protegido pelo preceito constitucional?
O doutrinador Hely Lopes Meirelles ensina em sua obra sobre a
questão dos limites da imunidade
material dos Vereadores:
“Endentemos que o espírito do Constituinte foi o de conceder
plena liberdade ao vereador na manifestação de suas opiniões sobre os assuntos
sujeitos à sua apreciação como agente político investido de mandato legislativo
local. Desta forma, ainda que esteja fora do Município, mas no exercício do
mandato, como representante do Legislativo municipal, deve gozar dessa
prerrogativa ao manifestar sua opinião, palavra ou ato.”[2]
Assim com tal interpretação fica claro que a territorialidade
do município de estende, desde que o trabalho exercido seja em nome do
Legislativo. Até porque ficaria contraditório o inc VII, do art. 28, da Carta
Magna, se a interpretação fosse outra.
No mundo jurídico e em especial quando há sustentações orais
ou declarações verbais sobre os mais variados temas, pessoas tendem a fazer
insinuações ou ofensas diretas e indiretas àqueles que detém o cargo público
que deve analisar, deliberar ou aprovar determinado tema.
A resposta deve ser a altura do questionamento ou acusação,
mas sempre deve-se manter profissional e ater-se ao tema e evitar ataques
pessoais.
Em caso recente no estado de Minas Gerais um vereador foi
condenado ao pagamento de indenização por proferir ofensas a um jornalista
chamando-o de “amarelo porque japonês é amarelo”, treteiro, caloteiro, entre
outra palavras,
EMENTA: APELAÇÃO - INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS - DISCURSO DE
VEREADOR NA CÂMARA MUNICIPAL - OFENSAS PESSOAIS DISSOCIADAS DO EXERCÍCIO DO
MANDATO - ACUSAÇÕES DO OFENDIDO - CULPA RECÍPROCA - INOCORRÊNCIA - VALOR DA
INDENIZAÇÃO - EXTENSÃO DO DANO. A inviolabilidade prevista no art. 29, VIII, da
Constituição da República, é restrita à atuação parlamentar do vereador, ou
seja, apenas exclui sua responsabilidade se o ato em tese ilícito foi cometido
não apenas no exercício da função, mas em razão dela, nos limites dos
interesses municipais. Se o vereador, ainda que em discurso na tribuna da
Câmara Municipal, extrapola o exercício de seu ofício e passa a proferir
ofensas pessoais como resposta a crítica de cidadãos à sua atuação legislativa,
abusa da garantia constitucional e, portanto, ausenta-se do círculo de proteção
dentro do qual é inviolável, para se responsabilizar por seus atos. Somente se
verifica a chamada culpa concorrente caso a conduta do ofendido tenha relação
de causa e efeito com o ato danoso, o que inocorre no caso de ofensas pessoais
proferidas em resposta a outras ofensas. Recurso não provido. APELAÇÃO CÍVEL N°
1.0352.05.020767-4/001 - COMARCA DE JANUÁRIA - APELANTE(S): JOAO FERREIRA LIMA
FILHO - APELADO(A)(S): HELENA ESCOBAR SAKAYA E OUTRO(A)(S), HERDEIROS DE
ROBERTO SUSSUMU SAKAYA - RELATOR: EXMO. SR. DES. GUTEMBERG DA MOTA E SILVA
Ocorre que a manifestação do vereador, mesmo que com a
intenção legítima e legal do direito de resposta a alguém que o havia ofendido
extrapolou o limite do seu cargo e partiu para o campo pessoal com acusações e
ataques verbais pessoais.
No entendimento do desembargador Gutemberg da Mota e Silva
(relator), a inviolabilidade dos vereadores é restrita à sua atuação
parlamentar, sendo necessário não só o vereador estar no exercício da função,
mas também agir em razão dela. Para o magistrado, "a inviolabilidade pode
ser reconhecida para isentar o parlamentar de responsabilidade por opiniões
emitidas em razão de seu ofício, como, por exemplo, quando denuncia esquemas de
corrupção de outros parlamentares ou autoridades do poder executivo, o que faz
parte de sua função fiscalizadora".
Raul Machado Horta, comentando a garantia institucional sob
comentário e citando doutrinadores franceses, leciona:
“A inviolabilidade obsta a propositura de ação civil ou penal
contra o parlamentar, por motivo de opinião ou votos proferidos no exercício de
suas funções. Ela protege, igualmente, os relatórios de trabalhos nas
Comissões. È absoluta, permanente, de ordem pública. A inviolabilidade é total.
As palavras e opiniões sustentadas no exercício do mandato fica excluídas de
ação repressiva ou condenatória, mesmo depois de extinto o mandato, que imuniza
o parlamentar em face de qualquer responsabilidade: penal, civil,
administrativa,e que perdura após o término do próprio mandato”[3].
Diante de tais preceitos podemos chegar a conclusão que o
vereador é imune, no seu exercício de Vereador. Todavia, se a situação e
opinião ficar desvinculado ao exercício
parlamentar municipal, a imunidade
constitucional é descaracterizada, gerando a ilicitude do abuso de
liberdade de expressão, injúria, calúnia ou difamação.
Insta salientar que não é porque o Vereador é imune que não
está sujeito a punições, todavia, tais punições deverão seguir processo próprio
previsto no regimento Interno da Casa
Legislativa.
O Regimento interno da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro
com claro objetivo de não deixar dúvidas incluiu a expressão no texto do art.13,
inc II, a impor a perda do mandato do vereador “cujo procedimento for declarado
incompatível com o decoro parlamentar”
Devo ressaltar que a imunidade objetiva a separação de
poderes através da possibilidade de expressão, voto e argumentos sem que o
Vereador esteja sujeito a punições de outras casas, o que obstaria a separação
de poderes.
Fontes:
MEIRELLES, Hely Lopes,
Direito municipal brasileiro. 7 ed São Paulo : Malheiros, 1994.
HORTA, Raul Machado apud MORAES,
Alexandre de. Direito constitucional. 6. ed. rev.
ampl. e atual. São Paulo :
Atlas, 1999.
Revista Trimestral da
Jurisprudencia, n 169(2), p. 731-732, ago. 1999.
[1]
Revista Trimestral da Jurisprudencia, n 169(2), p. 731-732, ago. 1999.
[2]
MEIRELLES, Hely Lopes, Direito municipal brasileiro. 7 ed São Paulo :
Malheiros, 1994. P. 454.
[3]
HORTA, Raul Machado apud MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 6. ed.
rev.
ampl. e atual. São Paulo : Atlas, 1999. p. 371.